sábado, 28 de março de 2009

A viagem para o Congresso de reconstrução da UNE

Saímos de São Paulo, no dia 27 de maio de 1979, rumo ao Congresso de Reconstrução da UNE, que se realizaria nos dias 29 e 30 em Salvador. Éramos muitos, em muitos ônibus, não me lembro quantos – talvez uns 100. No meu ônibus, cerca de 40 estudantes, representantes dos “centrinhos” da USP, como costumavam chamar os Centros Acadêmicos.

Na ansiedade esfuziante, não diferíamos muito dos ônibus de excursão do ginásio, nem daqueles das torcidas de futebol. No entanto, tínhamos consciência de que aquele era um momento histórico: discutíamos com paixão o socialismo, a guerrilha, a ditadura, os rachas nas organizações clandestinas, os professores, as relações afetivas, o aborto, a falta de grana, o amor livre, morar sem os pais, as drogas, o cinema, Marx, Lenin, Engels, Trotsky, Stálin, Brecht, Chaplin, Glauber, Vittorio de Sica... enfim, o mundo.
No ônibus, delegados eleitos da Biologia, Ciências Sociais, Geografia, Geologia, História, Letras, Psicologia e Química, prontos para enfrentar quase 40 horas de viagem – na verdade, durou mais de 50 – que nos levaria ao congresso. Sabíamos que havia riscos: a polícia estava presente nas principais estradas: volta e meia paravam os ônibus e revistavam todos de forma intimidatória.
Na chegada, ao entrarmos na avenida do Centro de Convenções, onde se realizaria o congresso, fomos recebidos em ovação pelos que lá estavam.
Só de São Paulo éramos quase 600 delegados. Ao chegarmos em Salvador, nos juntamos com os outros estudantes do Brasil inteiro, somamos então 10 mil. A cidade nos recebia agitada, em festa, mas povoada de militares e membros da tropa de choque, com escudos, capacetes, cachorros, cavalos e armas.
Eu tinha 20 anos, fazia parte da diretoria do Centro Acadêmico da Química da USP, e havia sido eleita para representar os estudantes do Instituto de Química. Era pura emoção, afinal, rumávamos para a reconstrução da UNE, colocada na clandestinidade pela ditadura militar em 1964.

trecho do depoimento de
Thais Sauaya Pereira
Leia texto completo em
http://www.facasper.com.br/cultura/site/ensaio.php?tabela=&id=97

Centro de Convenções



Todos os cantos do inacabado Centro de Convenções de Salvador serviam para acomodar os congressistas, todos sabendo fazer a hora e não esperando acontecer.
As escadarias, sem qualquer proteção, eram pontos privilegiados pela ampla visão da mesa do Congresso.
A verdade é que as acomodações eram péssimas, com a maioria dos presentes sentados no chão, mas de lá ninguem saia sem ver reconstruida a entidade que serviu de vanguarda na resistência ao golpe militar em 1964, que insistiu bravamente durante quatro anos na contestação do regime.
Era 1968 e o AI-5 colocava na clandestinidade a representação estudantil. Dai até 1971, seus dirigentes abnegados usavam nomes falsos e dormiam em onibus para não serem presos.
E então a UNE desapareceu junto com Honestino Guimarães, seu ultimo presidente.
Mas em 1973, na Usp, o que parecia morto já renascia.
E em 1979 se conquistava a obrigação de reconhecer a entidade como vanguarda na defesa do fim do regime militar, ao empunhar publicamente a palavra de ordem:
"Abaixo a Ditadura"

BLOQUEIO


Bloqueio na estrada organizado pela policia militar e rodoviária, um dos muitos.
Assim de memória lembro de Jacarei, Guaratingueta, Cruzeiro e Divisa com o Rio de Janeiro na Dutra.
Ai resolvemos abandonar esta estrada e desviar da repressão indo na direção de Vassouras. Ledo engano, por lá também haviam barreiras.
Neste caso percebam, vários onibus detidos, todos os documentos recolhidos.
Suspense, negociações e então começam a liberar um por um, em intervalos de 15 a 30 minutos, logo descobrimos que os onibus liberados partiram com documentos trocados para serem parados logo depois em outra barreira.

ABERTURA DO CONGRESSO


Ato de Abertura do 31º Congresso da União Nacional de Estudantes - UNE. Ótima oportunidade para identificar os personagens da foto. Figuras carimbadas e emblemáticas da antiga e nova esquerda.
Bem no canto direito discursa José Serra, como ex-presidente gestão 1964, ano do golpe militar. Nessa época ele integrava a AP, Ação Popular, organização derivada da Juventude Universitária Católica - JUC.
Ao seu lado Rui Cesar que seria o primeiro presidente da UNE reconstruida.
Observando os dois estão os personagens a serem identificados.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Veja 30 maio 1979



No calor a hora, a revista Veja deu capa para a UNE. O Congresso acontecia em Salvador e a revista perguntava sobre o futuro da entidade. Naquele momento o tema UNE dava Ibope e diversos veículos de comunicação noticiavam o evento. Diferente de hoje, quando a Veja critica a mobilização dos estudantes ocorrida na USP, o movimento estudantil servia aos interesses de uma vasta parcela da sociedade que queria o fim do regime militar.

Depoimento colhido na Internet

A reconstrução da UNE foi um marco. Não teve AI-5, nem general que conseguiu impedir o congresso de reconstrução em Salvador. Ali, nos braços do povo baiano, milhares de estudantes fizeram a festa. E que a policia tentasse algo contra. Iriam ter que acabar com a população da cidade, que apoiou abrindo portas e janelas para hospedar os participantes.
Vendo que a maré não estava prá peixe, os repressores haviam mudado a tática. Tentaram deter os líderes antes que eles chegassem a Salvador. Até listas negras foram distribuídas em aeroportos. A ordem era obstruir, deter, atrapalhar. Pelo menos foi o alerta chegado aos estudantes.
Barreiras policiais foram montadas na fronteiras entre os estados. Não adiantou. Todo mundo chegou lá. Os líderes de Pernambuco, por exemplo, foram levados por voluntários insuspeitos e desconhecidos das fichas policiais em seus automóveis particulares. Enquanto a policia vasculhava os ônibus com os delegados representantes a caminho, a liderança passava livremente as barreiras, dando sinais aos companheiros nos ônibus inspecionados, que após liberados seguiam gritando o refrão: Povo e soldado estão do nosso lado! O congresso foi um duro golpe na ditadura e foi uma farra.
Texto publicado pelo site ABK NET em 19/07/2005

domingo, 22 de março de 2009

Chapa Mutirão vencedora da eleição para primeira diretoria


Pediram. Então lá vai. Eis a foto da chapa que venceu a primeira eleição (direta) para a diretoria da União Nacional dos Estudantes em outubro de 1979. Em pé, atrás, da esquerda para a direita: Juarez Amorim, José Pimenta, Sergio Carneiro e Ivaneck Perez. Nas cadeiras: Marcelo Barbieri, Alon Feuerwerker, Luis Falcão (Lula), Candido Vaccarezza, Fredo Ebling e Gilberto Martin. Na frente: Aldo Rebelo, Rui Cesar (presidente), Maria Francisca de Souza (Kika), Pedro Reis Pereira e Vladir de Oliveira.
Publicado no Blog do Alon em 19/01/2007

Valerio Arcary fala sobre o Congresso

É com emoção que me recordo do Centro de Convenções em Salvador em 1979, ainda em obras - na verdade, não mais do que uma estrutura de concreto nua - onde muitos milhares se reuniram, desafiando a ditadura para o Congresso de Reconstrução. Foi lá que votamos a histórica Carta de Princípios que definia para a UNE um campo de classe. Foi lá que juramos que a nossa UNE estaria sempre ao lado dos trabalhadores, e da luta do povo mais pobre e mais oprimido. Essa UNE que era de todos nós - de uma gente que não temia a ditadura - infelizmente, já não existe mais. Agora que a geração de Salvador chegou ao poder, receio que, afinal, não fomos todos os que levamos aquele juramento da independência da UNE a sério.

De qualquer forma, mesmo recorrendo à perspectiva que os anos nos oferecem, levando para longe a inocência, creio que os sentimentos vividos naqueles dias na Bahia, ainda sejam uma parte do melhor que carregamos em nós. Guardo, também, excelentes recordações pessoais das polêmicas com Aldo Rebelo, Alon Feuerwerker, Marcelo Barbieri, Paulo Massoca, entre outros – ásperas, talvez até exaltadas, nunca ofensivas – que hoje estão no Palácio, ou apóiam o governo. Tenho orgulho de ter estado presente, já como convidado para debates, em muitos dos Congressos e CONEG’s da UNE nos últimos vinte anos.

A UNE esteve na linha de frente da resistência ao Governo Figueiredo entre 1979 e 1984, e cumpriu um papel na campanha das Diretas. Não hesitou em apoiar as lutas dos trabalhadores de inúmeras categorias e a grande Greve Geral em 1989. Em seu melhor momento, a UNE fez história e foi a entidade que furou o cerco e encabeçou o “Fora Collor” em 1992.
Publicado pelo site do PSTU
15/04/2005

Aldo Rebelo fala do Congresso

"O movimento estudantil fazia dura resistência ao regime militar. E sua atuação foi fundamental no processo de luta pelo fim da ditadura. Em outubro de 1979, com muito esforço, conseguimos reunir milhares de universitários em Salvador para o Congresso de Reconstrução da UNE. No ano seguinte, fui eleito seu presidente, num momento que considero um dos mais importantes da história do país, o da redemocratização", declara Aldo Rebelo em entrevista ao Jornal de Piracicaba. "O congresso de Piracicaba e o trabalho da nova diretoria eleita fizeram parte desse processo de busca de um país mais livre e socialmente mais justo", acrescenta.

Naquele início de década, João Herrmann Neto — que hoje é membro do Parlamento Mercosul — era o prefeito de Piracicaba e foi o responsável pela realização do congresso estudantil aqui. Em 1979, ele esteve na tal reunião clandestina da UNE em Salvador, quando decidiu-se que Piracicaba receberia o próximo congresso.
Publicado por
Jornal de Piracicaba
Marcelo Rocha
Dia 12 de agosto de 2007

Primeiro Presidente


Visitem a pagina do Orkut do vereador Wagner Balieiro de São José dos Campos. Lá voce encontrará esta capa da Veja de 1979 e outras imagens que fazem parte do projeto de recuperação da memória do Congresso de Salvador.
Rui Cesar se destacou durante o Congresso liderando os trabalhos e era o candidato a presidente no proprio, mas os tempos exigiam eleições diretas. Afinal, não podiamos querer mudar o mundo e repetir a pratica de eleições indiretas que continuavam garantindo a hegemonia de poder ao regime militar.
Mas garantiu o cargo em eleições diretas realizadas em novembro de 1979. Assim o estudante de Comunicações da Universidade Federal da Bahia tornou-se o primeiro presidente da UNE Reconstruida, mas ainda não legal.

Convocação para o Congresso de Reconstrução da Une


Cartaz oficial impresso pela Comissão Pró-UNE acatando decissão do IV Encontro Nacional de Estudantes, realizado em São Paulo no Prédio da Arquitetura na USP, em outubro de 1978.
Nesse encontro estiveram presentes cerca de 500 delegados de 14 estados, distribuidos entre independentes e militantes da Caminhando, Refazendo, Centelha, Liberdade e Luta, Novo Rumo e outras menores. Todas nascidas após 1973, filhas da criação do DCE da Usp e da UEE SP.
Ali decidiram pela realização do Congresso de Reconstrução da UNE em Salvador, Bahia, nos dias 29 e 30 de maio de 1979.

Teatro


Nos intervalos apresentações teatrais satirizavam personagens do momento politico.

Plenaria



Uma imagem inédita que mostra a atenção e a quantidade dos congressistas.